J.F.Herbart O filósofo alemão do século 19 inaugurou a
análise sistemática da educação e mostrou a importância da psicologia na
teorização do ensino Com o filósofo
alemão Johann Friedrich Herbart (1776-1841), a pedagogia foi formulada pela
primeira vez como uma ciência, sobriamente organizada, abrangente e
sistemática, com fins claros e meios definidos. A estrutura teórica
construída por Herbart se baseia numa filosofia do funcionamento da mente, o
que a torna duplamente pioneira: não só por seu caráter científico mas também por adotar a psicologia aplicada como eixo
central da educação. Desde então, e até os dias de hoje, o pensamento
pedagógico se vincula fortemente às teorias de aprendizagem e à psicologia do
desenvolvimento — um exemplo é a obra do suíço Jean Piaget (1896-1980). Para
Herbart, a mente funciona com base em representações — que podem ser imagens,
ideias ou qualquer outro tipo de manifestação psíquica isolada. O filósofo
negava a existência de faculdades inatas. A dinâmica da mente estaria nas
relações entre essas representações, que nem sempre são conscientes. Elas
podem se combinar e produzir resultados manifestos ou entrar em conflito
entre si e permanecer, em forma latente, numa espécie de domínio do
inconsciente. A descrição desse processo viria,
muitos anos depois, a influenciar a teoria psicanalítica de Sigmund Freud
(1856-1939). Uma das
contribuições mais duradouras de Herbart para a educação é o princípio de que
a doutrina pedagógica, para ser realmente científica,
precisa comprovar-se experimentalmente — uma ideia do filósofo
Immanuel Kant (1724-1804) que ele desenvolveu. Surgiram
daí as escolas de aplicação, que conhecemos até hoje. Elas respondem à
necessidade de alimentar a teoria com a prática e vice-versa, num processo de
atualização e aperfeiçoamento constantes. "Herbart fez um trabalho de
grande influência porque aprofundou suas concepções até as últimas consequências",
diz Maria Nazaré Amaral, professora da Faculdade de Educação da Universidade
de São Paulo (USP). Gênios em profusão na Alemanha Herbart viveu numa época em que a Alemanha produziu,
década após década, alguns dos mais importantes intelectuais da história da
humanidade. Alguns deles redefiniram seus campos de atuação, como Johann
Wolfgang von Goethe (1749-1832) na literatura e Kant
na filosofia. Curiosamente, o país naquele período era constituído por
dezenas de minúsculos principados, virtualmente independentes, mas
subservientes aos grandes centros de poder, como Paris e Londres. No entanto,
uma cultura sólida se desenvolvia nas universidades alemãs. A influência
protestante e a tendência dos governantes alemães de se cercarem de
funcionários cultos também ajudaram a criar um contexto em que os
intelectuais costumavam ser chamados a contribuir para o bem comum, mesmo que
o sistema político estivesse longe de ser democrático. Nas universidades, os
professores de filosofia tinham de ocupar também cátedras de pedagogia.
Várias gerações de intelectuais — agrupados sob as correntes idealista,
romântica e realista — deixaram, assim, contribuições fundamentais para a
educação.
Na teoria herbartiana, memória, sentimentos e desejos são apenas
modificações das representações mentais. Agir sobre elas, portanto, significa
influenciar em todas as esferas da vida de uma pessoa. Desse modo, Herbart
criou uma teoria da educação que pretende interferir diretamente nos
processos mentais do estudante como meio de orientar sua formação. Embora
profundamente intelectualista, a pedagogia herbartiana
tem como objetivo maior nem tanto o acúmulo de informações, mas a formação
moral do estudante. Por considerar a criança um ser moldado intelectualmente
e psiquicamente por forças externas, Herbart dá ênfase primordial ao conceito
de instrução. Ela é o instrumento pelo qual se alcançam os objetivos da
educação. "Para Herbart, só o ignorante comete erros", diz a pedagoga
Maria Nazaré. A instrução é
o elemento central dos três procedimentos que, para Herbart, constituem a
ação pedagógica. O primeiro é o que chamou de governo, ou seja, a manutenção
da ordem pelo controle do comportamento da criança, uma atribuição
inicialmente dos pais e depois dos professores. Trata-se de um conjunto de
regras imposto de fora, com o objetivo de manter a criança ocupada. O segundo
procedimento é a instrução educativa propriamente dita e seu motor é o
interesse, que deve ser múltiplo, variado e harmonicamente repartido. O
terceiro é a disciplina, que tem a função de preservar a vontade no caminho
da virtude. Nessa etapa se fortalece a autodeterminação como pré-requisito da
formação do caráter. Ao contrário do governo, consiste em um processo interno
do aluno. Muitas das
contribuições de Herbart para a psicologia e a pedagogia continuam valiosas,
mas seu pensamento e a prática que dele se originou no século 19 se tornaram
ultrapassados, sobretudo com o aparecimento do movimento da escola ativa. Seu
principal representante, o norte-americano John Dewey (1859-1952), fez duras
críticas à doutrina herbartiana. A pedagogia
contemporânea tornou o aluno sujeito do ensino e substituiu o individualismo
do século 18 por uma visão mais complexa dos fatores envolvidos no trabalho
de ensinar. "Hoje, admite-se no plano teórico que a mente humana é
originalmente ativa, enquanto na prática, no Brasil, ainda se costuma
despejar conhecimento sobre o aluno, como queria Herbart", critica Maria
Nazaré. Um padrão escolar para o século 19
Por se basear no princípio de que a mente humana apenas
apreende novos conhecimentos e só participa do aprendizado passivamente, o herbartianismo resultou num ensino que hoje qualificamos
de tradicional. "As escolas herbartianas
transmitiam um ensino totalmente receptivo, sem diálogo entre professor e
aluno e com aulas que obedeciam a esquemas rígidos e preestabelecidos",
diz a educadora Maria Nazaré. Herbart previa cinco etapas para o ato de
ensinar. A primeira, preparação, é o processo de relacionar o novo conteúdo a
conhecimentos ou lembranças que o aluno já possua, para que ele adquira
interesse na matéria. Em seguida vem a apresentação
ou demonstração do conteúdo. A terceira fase é a associação, na qual a
assimilação do assunto se completa por meio de comparações minuciosas com
conteúdos prévios. A generalização, quarto passo do processo, parte do
conteúdo recém-aprendido para a formulação de regras globais; é especialmente
importante para desenvolver a mente além da percepção imediata. A quinta
etapa é a da aplicação, que tem como objetivo mostrar utilidade para o que se
aprendeu. Quer saber mais? História da Educação e da Pedagogia, Lorenzo Luzuriaga, 292 págs.,
Ed. Nacional, tel. (11) 6099-7799, 36,20 reais História Geral da Pedagogia, Francisco Larroyo, 501 págs.,
Ed. Mestre Jou (edição esgotada) "A
pedagogia mostra os fins da educação; a psicologia, o caminho, os meios e os
obstáculos" Biografia Johann Friedrich Herbart nasceu em Oldenburg, na Alemanha, em 1776, e
conheceu alguns dos mais importantes intelectuais de seu tempo. Aos 18 anos,
já era aluno do filósofo Johann Fichte (1762-1814)
na Universidade de Iena. Logo em seguida, trabalhou
durante quatro anos como professor particular em Interlaken,
na Suíça, período em que ficou amigo do educador Johann Heinrich Pestalozzi
(1746-1827). Tornou-se professor na Universidade de Göttingen
em 1802. Seis anos depois, assumiu a cátedra deixada vaga por Immanuel Kant
em Königsberg, onde lecionou até 1833, quando
reassumiu o posto de professor de filosofia em Göttingen.
Em Königsberg, fundou um seminário pedagógico com
uma escola de aplicação e um internato. Os estudos mais importantes de
Herbart foram no campo da filosofia da mente, à qual
subordinou suas obras pedagógicas (entre elas, Pedagogia Geral e Esboço de um
Curso de Pedagogia). A influência de sua teoria se estendeu a uma legião de
pensadores, dando origem a várias interpretações, até entrar em declínio no
início do século 20. "Virtude
é o nome que convém ao objetivo pedagógico em sua totalidade. É a idéia da liberdade interior convertida em realidade
permanente numa pessoa" Para Pensar John Dewey criticou a teoria herbartiana
dizendo que ela previa um "mestre todo-poderoso", encarregado de
manipular os processos mentais do aluno por meio da instrução. Para Dewey e a
maioria dos pedagogos do século 20, o pensamento de Herbart subestima e até
ignora a ação do próprio aluno e sua capacidade de auto-educar-se. Mas não se pode negar que Herbart
foi um dos pensadores que mais se interessaram pela psicologia do educando e
o modo como ela influi em seu aprendizado. Você considera satisfatório seu
conhecimento dos processos psíquicos das crianças em geral e de seus alunos
em particular? Se acha que sim, de que modo pode utilizá-lo para
aprimorar suas aulas? |